No mundo do trabalho contemporâneo, a saúde e o bem-estar dos colaboradores nunca foram tão cruciais. E quando falamos em bem-estar, não podemos ignorar a saúde mental. É por isso que as recentes atualizações na Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que trata do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), são um marco importantíssimo para todas as empresas no Brasil.
A partir de 26 de maio de 2025, entra em vigor a Portaria MTE nº 1.419, de 27 de agosto de 2024, que inclui expressamente os fatores de riscos psicossociais relacionados ao trabalho no GRO. Mas o que isso significa na prática para a sua organização e, mais importante, para a saúde dos seus colaboradores? Vamos mergulhar nesse tema!
Por Que os Riscos Psicossociais Ganharam Destaque na NR-1?
A inclusão explícita desses riscos não é por acaso. Ela reflete uma crescente conscientização global sobre o impacto da saúde mental no ambiente de trabalho. Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2022 são alarmantes:
- Estima-se que 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos anualmente em todo o mundo devido à depressão e à ansiedade.
- Isso representa um custo de quase um trilhão de dólares à economia global, predominantemente relacionado à perda de produtividade.
No Brasil, o cenário não é diferente. Em 2022, transtornos mentais como “Outros transtornos ansiosos” (CID F41), “Episódios depressivos” (CID F32) e “Reações ao estresse grave e transtornos de adaptação” (CID F43) somaram 8,35% dos adoecimentos ocupacionais, ficando em segundo lugar, atrás apenas da Dorsalgia.
Esses números deixam claro: a saúde mental é uma questão fundamental de Segurança e Saúde no Trabalho (SST). A NR-1, ao incorporar os riscos psicossociais, busca prevenir o adoecimento mental e outros agravos à saúde do trabalhador, promovendo ambientes de trabalho mais saudáveis e produtivos.
As Principais Mudanças na NR-1 e a Conexão com a NR-17
O “Guia de informações sobre os Fatores de Riscos Psicossociais Relacionados ao Trabalho” do MTE detalha as mudanças:
- Inclusão Expressa dos Riscos Psicossociais no GRO: Agora, todas as organizações devem avaliar e controlar os perigos e riscos decorrentes de fatores psicossociais, como sobrecarga de trabalho e assédio, integrando-os ao inventário de riscos. Conforme o Guia Fatores de Riscos Psicossociais MTE, Seção 1:
“A NR-1 passou a incluir expressamente os fatores de riscos psicossociais relacionados ao trabalho no Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), conforme Portaria MTE nº 1.419/2024.”
É crucial entender que estamos falando de “fatores de riscos psicossociais relacionados ao trabalho”. Isso significa que o foco está nos perigos que surgem da concepção, organização e gestão do trabalho, e não em aspectos da vida pessoal do trabalhador que não estejam ligados à sua atividade profissional.
- Integração entre NR-1 e NR-17 (Ergonomia): A NR-1 agora exige que o GRO considere as condições de trabalho nos termos da NR-17, incluindo os fatores de risco psicossociais. No Guia Fatores de Riscos Psicossociais MTE, Seção 1, é destacado:
“Onde os fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho estão incluídos? Os fatores de risco psicossociais estão relacionados diretamente com a organização do trabalho.”
Isso reforça que problemas na organização e gestão do trabalho podem gerar efeitos na saúde psicológica, física e social do trabalhador, como estresse, esgotamento, DORT e depressão.
- Probabilidade Decorrente de Fatores Ergonômicos: Os riscos psicossociais foram incluídos na avaliação da probabilidade de ocorrência de lesões ou agravos decorrentes de fatores ergonômicos. A avaliação deve considerar as exigências da atividade de trabalho e a eficácia das medidas de prevenção.
Como Gerenciar os Fatores de Riscos Psicossociais na Prática?
A gestão desses riscos deve ser feita de forma combinada, utilizando as disposições da NR-1 e da NR-17. A NR-17 prevê dois métodos principais: a Avaliação Ergonômica Preliminar (AEP) e a Análise Ergonômica do Trabalho (AET). A AEP é uma abordagem inicial, alinhada ao GRO, e é obrigatória para todas as empresas, mesmo as dispensadas de elaborar o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR).
Para iniciar esse processo, o guia do MTE sugere passos preliminares essenciais:
- Verificar a Necessidade de Ajuda Especializada: Se sua organização não tem experiência no tema, buscar auxílio de profissionais com conhecimento técnico é fundamental.
- Envolver Todas as Partes Interessadas: Profissionais de SST (SESMT, se houver), níveis gerenciais, alta administração, líderes de equipe e, principalmente, todos os trabalhadores devem estar engajados.
- Atribuir Responsabilidades: Definir claramente quem fará o quê em cada etapa do processo.
- Comunicar os Trabalhadores: A comunicação transparente é essencial. Explique os objetivos, os métodos (como questionários, se for o caso) e os resultados esperados para promover a adesão. O Guia Fatores de Riscos Psicossociais MTE, Seção 2, enfatiza:
“A comunicação transparente com os trabalhadores é essencial.”
Identificando os Perigos: Exemplos Práticos
Para ajudar na identificação, o guia apresenta uma lista exemplificativa de fatores de risco psicossociais e suas possíveis consequências:
Perigo (Fator de Risco) | Possível Consequência (Lesão ou Agravo) |
---|---|
Assédio de qualquer natureza no trabalho | Transtorno mental |
Má gestão de mudanças organizacionais | Transtorno mental; DORT |
Baixa clareza de papel/função | Transtorno mental |
Baixas recompensas e reconhecimento | Transtorno mental |
Falta de suporte/apoio no trabalho | Transtorno mental |
Baixo controle no trabalho/Falta de autonomia | Transtorno mental; DORT |
Baixa justiça organizacional | Transtorno mental |
Eventos violentos ou traumáticos | Transtorno mental |
Baixa demanda no trabalho (subcarga) | Transtorno mental |
Excesso de demandas no trabalho (sobrecarga) | Transtorno mental; DORT |
Maus relacionamentos no local de trabalho | Transtorno mental |
Trabalho em condições de difícil comunicação | Transtorno mental |
Trabalho remoto e isolado | Transtorno mental; Fadiga |
Fonte: Adaptado do Guia Fatores de Riscos Psicossociais MTE, Seção 2.
Preparação e Implementação do Processo
A preparação envolve levantar informações detalhadas sobre o estabelecimento, processos produtivos, postos de trabalho e características dos trabalhadores. Também é importante reunir dados de saúde (afastamentos, CATs, PCMSO) e análises anteriores.
A organização deve definir a estratégia para conduzir a identificação e avaliação, que pode incluir:
- Observação da atividade de trabalho: Incluindo diálogo direto com o trabalhador.
- Pesquisas padronizadas: Utilizando instrumentos validados.
- Oficinas ou workshops: Com auxílio de moderação.
- Combinação dessas opções.
Importante: O MTE não indica uma ferramenta ou metodologia específica. A escolha é da organização, mas a ferramenta deve ser adequada ao risco e às condições da empresa, cientificamente fundamentada e aplicada por profissionais qualificados. Além disso, é fundamental manter o anonimato dos trabalhadores em questionários para criar um ambiente de confiança.
O Guia Fatores de Riscos Psicossociais MTE, Seção 3, ressalta:
“A chave para a organização ter sucesso no processo de identificação e avaliação dos fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho é fazer um bom planejamento e uma boa preparação.”
Durante a implementação, o foco deve ser na atividade real que o trabalhador está desenvolvendo, e não apenas na tarefa prescrita. A avaliação do risco pode ser qualitativa, baseada no conhecimento e expertise do profissional.
Atenção: Não confunda a avaliação de riscos psicossociais do GRO/PGR com exames médicos de aptidão. O objetivo do GRO é verificar as condições de trabalho e identificar fatores adoecedores, não avaliar a saúde mental individual do trabalhador.
Controle e Acompanhamento das Medidas de Prevenção
Após identificar e avaliar os riscos, é hora de agir! Um plano de ação deve ser elaborado, com cronograma, responsáveis e formas de acompanhamento. As medidas de prevenção devem seguir a ordem de prioridade estabelecida na NR-1.
A participação dos trabalhadores é crucial nesta etapa. Eles são os principais vigilantes da eficácia das medidas implementadas e podem fornecer feedback valioso para a melhoria contínua. Se uma medida não for eficaz, o processo de avaliação de riscos deve ser revisado e novas ações devem ser adotadas.
Documentação Essencial
Todas as etapas desse processo devem ser registradas nos documentos do PGR ou da AEP. O inventário de riscos ocupacionais deve contemplar, no mínimo, as seguintes informações:
- Caracterização dos processos e ambientes de trabalho.
- Caracterização das atividades.
- Descrição dos perigos, com identificação das fontes e/ou circunstâncias.
- Indicação das possíveis lesões ou agravos à saúde.
- Indicação dos grupos de trabalhadores expostos.
- Descrição das medidas de prevenção implementadas.
- Caracterização da exposição dos trabalhadores aos perigos.
- Dados da análise preliminar ou monitoramento de exposições e resultados da avaliação de ergonomia.
- Avaliação dos riscos, incluindo a classificação para o plano de ação.
Um Passo Essencial para o Bem-Estar e a Produtividade
A inclusão dos fatores de riscos psicossociais na NR-1 representa um avanço significativo na legislação brasileira de segurança e saúde no trabalho. É um convite para que as empresas olhem de forma mais atenta e proativa para a saúde mental de seus colaboradores, reconhecendo que um ambiente de trabalho saudável é a base para a produtividade e o sucesso.
Na Catividade, acreditamos que investir no bem-estar dos trabalhadores é investir no futuro da sua empresa. Ao gerenciar os riscos psicossociais, você não apenas cumpre a legislação, mas também constrói uma cultura organizacional mais resiliente, engajada e humana.